sábado, 23 de dezembro de 2023

 


Aquela moça está chorando blues. Aquela moça está fumando tristezas. Estar sozinha é um beijo na nuca, um abraço de asfixia que estrangula e deixa respirar para depois matar de forma suicida. Sensação de família, sentido por filhos que hoje são pais, a gente reconhece no olhar. Enquanto Miles Davis pede chuva, ela só consegue chover incertezas. Aquela vida precisa de saídas, para longe dessa batida, olhar de quem entende o mundo e sorri o sorriso de quem aceita. Aquela moça precisa de paciência. São trópicos tristes tudo aquilo. E assim ela fica. Virando esfinge, com segredos esquecidos, derramando o pouco de vida. É assim que fica, chorando desertos e vivendo num vício de roda viva. Aqueça moça está virando nuvem, de forma indefinidas, e enquanto dança a dança da chuva, ela pede Miles Davis e Deus escuta. Aquela moça está ficando azul. Aquela moça está fumando tristezas.



 

Vejo nuvens de palavras, ela pensa. Mil cores e odores, com todas as dores deste mundo fantástico. Deslumbrada, entre tantas novidades infinitas, o sonho super sonho. No labirinto da mente ela está no chão. E ainda ri. Em um minuto, tudo isso irá sumir, o inferno é coisa de gente que pensa. Aí ela gira, corre e vive. Sentindo-se dona das próprias lágrimas, não há tempo para virar lembrança. Mas, ali, naquele canto de chão há algo sem nome. Escrito no oriente do corpo, subindo pela espinha, aranha de paredes nuas com traço de menina. Reconhecida numa batalha perdida, ela foge pedindo socorro. E quem escuta? Ainda é de manhã, e lá fora o dia existe sem pedir, e dentro dela só estrelas tardias, de pequenas luzes para quem o olhar custa. Mais tarde, com um copo na mão, ela pensa mil ideias de mundos fantásticos, com mil cores e sons, a vida que alguém sempre sonha. Ela ri e diz estar feliz, fechando os olhos sonhadores. E ainda jura: amanhã será um dia melhor.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

 



Desejo de ter. O que corrompe a retina, tal qual o sexo, a droga ou mentira. Desejar o desejado. Só queremos de fato o que nunca tivemos. Desejar de maio a maio, com a mão fechada, no portão da casa, na rua esquecida, na vida não vivida, na raiva de um amor que mata. Desejo areia, escorrendo pelas mãos, inundação de pó pelos olhos, banhando o corpo, sufocando todo este mundo chamado você. Sufoco areia, desejo de voltar do fundo do poço. Desejo de verdade, nem sempre é ironia. Desejar a matéria, cada canto, cada espanto, desejo de ser dois numa cama de um só corpo. Desejo de carne, mas também há alma. Eu desejo ter. E você?